Espiritualidade em Movimento (SOR) – Páscoa

Antônio Chaves de Santana

Estamos dentro da oitava da Páscoa, vivendo a festa das festas, a celebração das celebrações, a liturgia das liturgias, a Páscoa do Senhor, cujas raízes repousam no judaísmo, mas que foram absorvidas pelo cristianismo, e depois, de certo modo, deturpadas e transformadas na celebração atual, com seus coelhinhos, como seus ovos de páscoa e com uma festa que quase não guarda nenhuma relação com a Páscoa genuína.

Então, o que é Páscoa? Páscoa, na tradição judaica, é uma celebração do cativeiro do Egito. Contudo é importante ressaltar que, quando nós falamos de Páscoa, estamos falando de religiosidade. E, no universo da religiosidade, falamos de símbolos, de metáforas, porque a religiosidade tem a ver com o sentimento, com a experiência pessoal e com a experiência que a criatura faz de Deus.

É óbvio que é impossível traduzir uma experiência tão subjetiva, tão espiritualmente rica, com a linguagem da ciência, que é uma linguagem matemática, analítica, ou com a linguagem filosófica, que é especulativa e por vezes complexa demais. A religiosidade é uma linguagem onírica, dos sonhos que opta pela metáfora. E, portanto, a Páscoa tem muita dessa simbologia onírica, dos sonhos.

O que diz a Páscoa? Que o povo hebreu estava escravo há 400 anos no Egito. Egito significa estreiteza.  Ele foi invadido então por um anjo da morte, naquelas casas que tivessem uma marca de sangue de um cordeiro, o anjo pularia aquela casa. Como verbo pular, em hebraico, é “pesach”, daí vem “Pascoa”. A Páscoa é então o pulo do anjo. O pulo que ele dá nas casas que têm a marca do cordeiro e que, portanto, foram poupados da tragédia de perderem o filho mais velho da casa. Essa é a simbologia!

Por que o cordeiro? Na celebração da Páscoa judaica, o cordeiro ficava uma semana com a família. Ali as crianças brincavam com o animalzinho, criavam uma relação de afeto com ele. Dessa forma, tornava-se quase um membro da família. E então, ao entardecer da sexta-feira, toda a família se reunia e o animal era sacrificado. E tinha que ser assim. Porque se alimentar da Páscoa, precisava ser uma experiência de dor, a experiência da perda de alguém amado.

Nessa perspectiva, a Páscoa tem a ver com essa experiência espiritual. É muito mais que uma experiência da desilusão. E você não se desilude sem perder. Por isso, esse choque do cordeirinho imolado. Com a vinda de Jesus, o quê que Ele faz? Ele convive por três anos com seus discípulos. Cura cegos, paralíticos, ressuscita mortos, janta todo dia na casa de Simão Pedro, trabalha como se fosse um deles, acorda cedinho, vai pescar com os discípulos até o entardecer. Convive com eles diariamente, participa das suas dores, sofre as imperfeições de cada um deles e, no momento final dos três anos, reúne os doze e diz assim:

“Vocês vão me perder. Eu estou agora, me despedindo de vocês. Porque eu vou deixar o mundo, pois um pouco de tempo me vereis e um por um pouco de tempo não me vereis mais porque estou de volta para o meu Pai. E vocês vão experimentar uma tremenda tristeza. Uma profunda dor. Porque vocês criaram uma conexão emocional comigo. Eu não os esquecerei. Eu não chamo vocês mais de servos, eu chamo vocês de amigos. Porque tudo que eu aprendi, eu compartilhei com vocês”.

“Eu amei vocês da maneira que eu poderia amar. Eu amei tanto que você, Pedro, vai me negar, vai me trair, mas eu continuo te amando. Nada vai alterar o meu amor por você. Eu amo tanto você, judas, que mesmo sabendo que você vai me trair, não estou te expulsando. Eu estou comendo com você, e eu te perdoo”.

Portanto, essa crise de morte é apenas um portal para a imortalidade. Porque a vida não cessa no túmulo. A última palavra não é a morte, pois não há outra alternativa para quem faz a experiência de Páscoa: ou a ressurreição ou a vida.

Então, toda vez que vocês se sentirem solitários, toda vez que vocês sentirem falta da minha amizade, do meu amor, da minha dedicação, da minha presença, vocês vão se reunir, e celebrem a Páscoa em minha memória. Em memória da minha amizade, em memória do meu amor e, sobretudo, em memória da minha ressurreição. A experiência de Páscoa é a experiência de amar e de se sentir amado, não importam as circunstâncias.

Feliz Páscoa!

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